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Professora de Filosofia Política e Retórica da Escola de Comunicações e Artes da USP, Marília Fiorillo comenta no podcast “Conflito e Diálogo” o peso das crenças no eleitorado brasileiro, em detrimento de escolhas maduras e racionais. A seguir, um resumo da coluna “Afinal, qual é o X da questão”, publicada na Rádio USP
Imagem do Pixabay

Repare:

  • a autora destaca que, no jogo das eleições, a escolha de candidatos apoia-se muito mais em crenças do que na realidade dos fatos;
  • as redes sociais agravam essa tendência, já que estimulam visões políticas radicais, polarizadas e impermeáveis ao debate e pensamento crítico;
  • de acordo com Fiorillo, as crenças são importantes na infância, já que facilitam a assimilação de regras básicas para a sobrevivência;
  • no entanto, quando as crenças continuam sendo o principal farol da vida adulta, a tomada de decisões pautadas pela maturidade e razão perde espaço.

Afinal, qual é o X da questão?

Resumo da coluna publicada no podcast Conflito e Diálogo, em 06/09/2024, na Rádio USP

“O X da questão atualmente é a crença”, afirma a professora logo no início de sua coluna. Para ela, no momento de se tomar uma decisão, nada supera a crença, “nem mesmo a visão nua e crua dos fatos diante do próprio nariz”.  O homem se regozija ao identificar o que já conhece, prossegue ela, e padece e detesta o que lhe é estranho.

“As redes antissociais só levaram ao cúmulo essa tendência, transfigurando a arte do debate na luxúria da ofensa e do xingamento.” Qual seria a motivação que torna as pessoas tão apegadas às suas crenças e tão furiosas quando alguém ousa “contrabandear um ‘mas será mesmo isso’ para dentro de suas certezas impermeáveis?”, pergunta ela.

“Há quem diga que o pendor humano pela crença, tão antigo, é uma decorrência mais da biologia do que do sobrenatural, isto é, algo que foi necessário para a sobrevivência da espécie na infância, mas permanece como patologia na vida adulta.” Essa é a tese de Pascal Boyer em seu livro Religion Explained.

Mais adiante ela prossegue: “Para que a criança saia ilesa da multidão de perigos que a cercam, tem que saber desde cedo a aceitar, sem protestar, certas verdades elementares que lhe são transmitidas pelos pais e pelas pessoas em torno. Por exemplo: a verdade de que ela não pode se pendurar do terraço do apartamento, se não cai e se machuca, ou não deve colocar o dedo na tomada, ou precisa concordar que a Terra é redonda […] é por isso que obedecer cegamente e acreditar piamente – o que é a base da religião – na infância é muito vantajoso e sensato”, atesta Marília.

“Mas se esse hábito se prolonga pela idade adulta, vira patologia, isto é, a credulidade crônica de algo que já perdeu a sua razão de ser e se transformou num automatismo e numa mania obsessiva. Com tantas eleições à vista, que eleitor decidirá a vitória? Será o bebê engatinhando, que ainda se limita a dar crédito àquilo que lhe diziam antigamente e sempre, ou o adulto equilibrado em duas pernas e capaz de convencer-se a dizer não? Pensar dá trabalho… e como.”

Marília Fiorillo

Professora de Filosofia Política e Retórica da Escola de Comunicações e Artes da USP e autora do podcast “Conflito e Diálogo”

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